#rolounarede: adolescentes e a autorização para saídas noturnas
O tema “Adolescentes” rendeu diversas mensagens entre os integrantes do Acolhimento em Rede no mês de abril.
O assunto foi iniciado pela Carolinne, que perguntou aos integrantes da rede que trabalham nos serviços que acolhem jovens sobre o assunto “autorização de saída para festas noturnas”. Ela questionou como as entidades realizam os procedimentos legais.
Algum responsável pelo Acolhimento CIM respondeu em seguida que no abrigo deles não é permitido que os jovens saiam para festas.
Uma integrante da rede chamada Sônia fez o seguinte questionamento: “Qual o impedimento dos adolescentes irem para festas? Acho importante saber qual o tipo de festa. Simplesmente proibir não tem sustentação, pois pode incentivar a transgressão, ou seja, a fuga”, escreveu.
Carolinne disse também pensar que é perfeitamente possível autorizar a saída, mesmo que sejam necessários alguns critérios. A integrante da rede perguntou, então, se algum outro abrigo permite essa saída, se algum educador acompanha, quem paga a entrada do jovem em determinada festa e, por fim, com que frequência ele é autorizado a deixar o abrigo.
Julio, em email seguinte, defende que todas as regras têm que fazer sentido, pois simplesmente fazer uma regra sem fundamento ela será apenas um dificultador da confiança entre o jovem e os funcionários do abrigo. Ele considerou que o questionamento do jovem ou da criança será evidente, até porque, os abrigos são sinônimos de proteção, ou seja, de limites claros.
Ele acredita que existe a possibilidade de permitir a saída do adolescente, desde que o abrigo saiba onde será a festa, quem a promove, quais horários de início e fim. Segundo ele, tudo isso faz parte do cuidado com o jovem, além de estar possibilitando o desenvolvimento de sua autonomia. E finalizou: “A maturidade do jovem deve ser considerada no momento da decisão: deixá-lo ir ou não”.
Julio, em um novo e-mail, retomou o assunto e afirmou que cada caso deverá ser tratado diferentemente do outro. É preciso saber se o adolescente tem renda para arcar com as despesas. E, em caso negativo, se a instituição precisa destinar recurso a essa despesa como uma atividade pedagógica, por exemplo. “É uma socialização para a autonomia”, considerou.
Juliana disse concordar com as colocações de Julio. Ela disse que, quando trabalhou com jovens em acolhimento, o serviço analisava o caso, mas que, regularmente, eles permitiam a ida de jovens a festas noturnas. “Claro que com limite e responsabilidade”, pontuou.
Ela afirma que os funcionários do abrigo procuravam saber onde era o local, qual era o tipo de festa, além do horário. Segundo Juliana, sempre havia uma reflexão junto do adolescente sobre a responsabilidade que ele precisaria conquistar para poder sair sozinho. Ela termina dizendo que essa confiança necessita ser conquistada nas ações com o jovem no dia a dia.
Em um email direcionado à Caroline, a integrante que iniciou o questionamento, Renato considerou que, a partir de sua própria experiência, ele acredita que o processo de aquisição da autonomia é que vai preparar o sujeito para a vida. “Colhi falhas e muitos frutos, mais frutos de responsabilidade do que irresponsabilidade. Como coordenador de uma casa lar de adolescentes sempre trabalhei o direito de ir e vir. Eles estão assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente de ir e voltar na hora que os adultos pactuarem. O que quase sempre funcionou, afinal a liberdade é construída com responsabilidade”, disse.
Renato lembrou uma frase do educador Paulo Freire a qual afirmava que a autonomia é algo que o sujeito precisa experimentar, errar às vezes, mas muitas vezes também aprender com as consequências. Para Renato, o jovem só consegue construir limites dentro de si quando experimenta erros também dentro de si.
Renato ressalta ainda que se os abrigos avançaram para uma condição “extra muro judicial” é porque o modelo de antes não funcionava e os direito não eram assegurados.
“Participar da vida em comunidade sem discriminação é um direito e não um favor. Estar em locais públicos e ir a espetáculos também são direitos. Ir para uma balada de forma segura e se preservar para não utilizar drogas e outras coisas prejudiciais é um caminho a ser construído com os adultos. Isso previsto no Estatuto (Estatuto da Criança e do Adolescente)”, defendeu.
Renato considerou que atualmente existem muitas referências sobre o assunto, como nas Orientações Técnicas e no Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária. No entanto, ainda há perguntas a serem respondidas, como por exemplo: “Haverá algum adulto para acompanhar o jovem? Isso é sadio? É educativo? Tem outros adolescentes indo?”.
“Comigo, no abrigo onde trabalhei com os jovens, ora os acompanhávamos, ora estabelecíamos horários e combinados claros do que era permitido ou não que eles fizessem”, relembrou Renato.
Ele finalizou seu posicionamento dizendo que se houver risco para o jovem, quem deveria ver isso é o Poder Público e proibir a ida não apenas do jovem abrigado, mas sim de todos os demais jovens envolvidos. Segundo ele, essa determinação está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 74 das disposições gerais.
Caroline agradeceu a intervenção de Renato e disse considerar a discussão importante para fundamentar a questão, pois ela participará de uma reunião com as educadoras do abrigo em que trabalha. E que lá, por enquanto, essa saída ainda não é permitida. E disse aceitar sugestões de textos sobre o tema.
Renato retomou a conversa dizendo que os meninos e meninas não serão iguais se a sociedade não os tratar de forma igual.
Rosa Luiza iniciou a conversa dizendo que é realmente muito boa a discussão em questão. Agradeceu a todos pela contribuição de cada um e disse que levará o tema e as defesas para serem debatidos na instituição onde ela atua.
Por fim, a Isabela Lemos, que é técnica do Grupo nÓs, o programa do Instituto Fazendo História que é voltado para jovens que estão saindo dos serviços de acolhimento, fez uma consideração a respeito da discussão com o seguinte texto:
Olá pessoal,
Achamos super-relevante este questionamento sobre autonomia e adolescência! Observamos que a autorização para saídas a festas e afins é um desafio e tanto para os serviços de acolhimento em geral.
Compartilho, então, reflexões que surgiram em nossa Oficina “Adolescência: Conflitos e limites”, onde a psicóloga Lurdinha Trassi aponta que “A autonomia é compreendida como um processo, e deve ser trabalhada desde a infância, para que a institucionalização não limite as possibilidades dos adolescentes em suas vidas durante e após o período de acolhimento. É importante considerar a realidade na qual cada adolescente está inserido, mas é fundamental apresentar novas possibilidades e experiências como projeto de vida”. Ela também ressalta a importância de promover o diálogo com o adolescente, como um norte para o trabalho: “Não se trata de ter uma postura de permissividade e nem de proibição, mas de muito diálogo”.
Pensando no desenvolvimento da autonomia destes adolescentes, compartilho também o recém lançado Portal nÓs no Mundo, iniciativa do Instituto Fazendo História. Uma plataforma digital com informações sobre cidadania, identidade, trabalho, moradia e uso consciente do dinheiro. Explorar a ferramenta junto com estes adolescentes pode ser uma boa estratégia para iniciar ou ampliar este diálogo com os jovens! Temos também uma página no facebook, onde compartilhamos as publicações do portal. Para quem quiser saber mais, a ferramenta também saiu em uma matéria da Fundação Telefônica.
Espero que estes links todos possam somar em nossas práticas desafiadoras! 🙂